Empresas ao redor do mundo vêm implantando a semana de quatro dias de trabalho, seja em forma de teste para avaliar os resultados ou de forma definitiva.
No Brasil, a empresa de produtos pet Zee.Dog adotou o modelo de jornada em março do ano passado para aumentar a qualidade de vida e a produtividade dos funcionários nos escritórios da empresa de São Paulo e Rio de Janeiro, além de Madri (Espanha) e Shenzhen (China).
“Com a carga reduzida, a qualidade de vida aumenta, o nível de estresse diminui e, consequentemente, a produtividade da equipe aumenta”, afirma a empresa.
A semana de trabalho reduzida foi chamada de #NoWorkWednesday, em que os funcionários tiram as quartas-feiras de folga. A ideia permite que cada colaborador se organize nos 4 dias para entregar suas tarefas.
O desafio da empresa foi adaptar o modelo ao Brasil devido à grande quantidade de feriados. Mas foi decidido que, quando houver uma semana com feriado, a quarta-feira contará como dia normal de trabalho.
Pesquisa feita após a primeira semana da nova escala de trabalho mostrou que 100% dos funcionários ficaram satisfeitos e entregaram todas as tarefas dentro dos prazos.
É possível o Brasil ter uma semana de quatro dias de trabalho? Entenda
Por que semana de quatro dias é ‘sucesso gigantesco’ na Islândia
As vantagens e desvantagens de trabalhar só 4 dias por semana
Islândia
A Islândia testou uma semana de trabalho de apenas quatro dias e o sucesso foi “esmagador”, segundo pesquisadores. O resultado foi que a produtividade foi a mesma ou melhorou na maioria dos locais de trabalho. Além disso, os trabalhadores relataram se sentir menos estressados ou com menor risco de esgotamento. Houve ainda melhora na saúde e maior equilíbrio entre vida profissional e familiar.
A jornada semanal de 40 horas passou para 35 ou 36 horas, com os trabalhadores recebendo a mesma remuneração. Os resultados levaram os sindicatos a renegociar os padrões de trabalho, e 86% da força de trabalho mudou as escalas para menos horas trabalhadas, mas com a manutenção dos salários.
Nova Zelândia
Na Nova Zelândia, a Unilever e a Perpetual Guardian implantaram a semana de 4 dias.
A Unilever está testando desde dezembro de 2020 a redução da jornada para quatro dias sem reduzir o salário. A experiência vai durar um ano com os 81 funcionários da empresa na Nova Zelândia. Eles podem participar do teste com autonomia e flexibilidade, determinando quando e como trabalharão melhor dentro da nova estrutura.
Nick Bangs, diretor-gerente da Unilever Nova Zelândia, diz que a motivação foram a Perpetual Guardian, da Nova Zelândia, e a Microsoft no Japão, além da necessidade de buscar formas mais flexíveis de trabalhar em meio à pandemia. Para ele, “as velhas formas de trabalhar estão obsoletas”.
A multinacional vai medir o desempenho dos trabalhadores em relação aos seus resultados e, de acordo com as conclusões do experimento, a empresa decidirá se vai aplicar o novo regime de trabalho em outros países.
No caso da empresa de serviços financeiros Perpetual Guardian, um projeto-piloto implantado em 2018 incluiu os 240 funcionários na nova jornada, sem alteração nos salários. Os resultados foram os seguintes:
O estresse diminuiu em 7%;
A satisfação geral com o trabalho aumentou em 5%;
O equilíbrio entre a vida pessoal e o trabalho subiu de 54% para 78%.
Segundo Charlotte Lockhart, diretora executiva da organização Semana de 4 Dias, uma das responsáveis pela implementação da semana de trabalho de quatro dias na Perpetual Guardian, as faltas ao trabalho diminuíram e o bem-estar do trabalhador aumentou.
Além disso, segundo ela, o projeto despertou o interesse de outras multinacionais em fazer experimentos para reduzir a jornada de trabalho.
Japão
A Microsoft Japão conduziu um experimento de quatro dias úteis que durou um mês em agosto de 2019.
A estratégia teve o objetivo de melhorar o equilíbrio entre a vida pessoal e o trabalho de seus funcionários.
Ao implantar o fim de semana com três dias, a Microsoft descobriu que, ao diminuir horas na semana de trabalho, a produtividade teve um aumento expressivo. Os 2.300 funcionários tiveram todas as sextas-feiras de folga. E a produtividade aumentou 40% no período.
O estudo constatou que a semana de trabalho de quatro dias forçou os funcionários a usarem seu tempo com mais eficiência – muitas reuniões foram cortadas, encurtadas ou alteradas para reuniões virtuais em vez de presenciais.
Os funcionários também tiraram 25,4% menos dias de folga durante o mês, imprimiram 58,7% menos páginas e consumiram 23,1% menos eletricidade no escritório.
Ao final de agosto de 2019, pesquisa mostrou que 92,1% dos funcionários aprovaram a semana de trabalho de quatro dias. Devido ao sucesso do programa, a Microsoft diz que planeja implementá-lo em outras datas no futuro.
Espanha
A Espanha está buscando voluntários em centenas de empresas para testar o que acontece com a produtividade quando os funcionários trabalham apenas 32 horas por semana, em vez das 40 habituais. Ou seja, redução de 5 para 4 os dias em que a equipe de fato trabalha – sem, contudo, que haja uma diminuição proporcional do salário.
De acordo com Héctor Tejero, coordenador do projeto, a redução da jornada se torna um mecanismo de atração de talentos.
Inicialmente, o governo espanhol vai financiar o projeto-piloto, subsidiando o custo das empresas com a redução da jornada semanal.
Entre as empresas que já estão testando a semana de 4 dias está a Delsol Software, que reportou queda de 30% nas faltas e atrasos dos funcionários no primeiro mês na comparação com igual período do ano anterior.
A rede de restaurantes La Francachela também reduziu a semana de trabalho de seus funcionários para 4 dias, mantendo a remuneração da equipe de 60 pessoas. As mudanças começaram com o fechamento dos restaurantes por conta da pandemia. Implementar a semana de 4 dias permitiu à rede remodelar a escala de plantões, com a divisão do time em dois grupos.
Já a prefeitura da cidade de Valência anunciou em outubro de 2020 subsídios para empresas que adotarem esse regime de trabalho.
De acordo com o secretário regional do emprego, Enric Nomdedéu, o objetivo é melhorar o equilíbrio entre o trabalho e a vida privada, reduzir a pegada de carbono e aumentar a produtividade.
Adesão em outros países
Entre as empresas que reduziram a semana de trabalho estão ainda a Nicholson Search, do Reino Unido, a dinamarquesa IIh Nordic e a americana Monograph, que começaram com o novo modelo de trabalho há mais de quatro anos.
Outros exemplos são as empresas britânicas MRL Consulting, Morrisons, ICE Recruitment e Buffer.
A rede norte-americana de fast food Shake Shack reduziu a jornada semanal para 32 horas e manteve o salário de seus funcionários. A empresa expandiu o experimento no início de 2020 para um terço de seus 164 restaurantes.
Já a Pursuit Marketing, na Escócia, teve aumento de 22% na produtividade ao implementar o novo sistema de jornada.
Jan-Emmanuel De Neve, diretor do centro de pesquisas sobre bem-estar da Universidade de Oxford, no Reino Unido, destaca que todos os estudos que avaliaram o impacto de uma semana de quatro dias mostraram resultados positivos em termos de produtividade, bem-estar dos funcionários e no equilíbrio entre vida profissional e pessoal.
“Não vi nenhum estudo que apontasse para o resultado oposto”, disse De Neve em entrevista à BBC. Segundo ele, há evidências causais sobre o impacto do bem-estar do funcionário na produtividade.
Mais exceção que regra
Algumas startups experimentaram o sistema, mas acabaram voltando à tradicional semana de trabalho.
Isso aconteceu com a Treehouse, uma empresa americana que ajuda a recrutar e treinar talentos em tecnologia. O sistema de jornada durou quase 10 anos, mas seu fundador, Ryan Carson, decidiu voltar ao tradicional esquema de 5 dias em 2016 porque a competição estava muito acirrada.
As boas experiências das empresas norte-americanas têm sido mais exceção do que regra nos EUA, país onde a redução da jornada de trabalho não ganha espaço porque vai contra as noções de ética do trabalho e capitalismo existentes no país, segundo Peter Cappelli, professor da Wharton School da Universidade da Pensilvânia, em entrevista à BBC.
E como as empresas costumam se concentrar em responder aos acionistas, explica, tendem a priorizar os lucros em relação aos benefícios dos funcionários.