As polícias do Rio têm desde semana passada mais uma nova lista de fugitivos para procurar: os 255 presos que foram soltos para o Natal e ainda não voltaram. São pessoas que receberam o benefício de saída temporária especial, o chamado saidão.
O RJ2 respondeu algumas perguntas sobre como funciona esse benefício para os apenados:
Como funciona este benefício?
O pedido deve ser feito pela defesa do preso.
O juiz da Vara de Execuções Penais pede ao Ministério Público que diga se concorda com a liberação temporária.
Paralelamente, a Secretaria de Administração Penitenciária também é ouvida para informar sobre o comportamento do detento
E se todos disserem sim, o juiz concede o benefício
Quais são as condições iniciais para a saída do preso ?
Para que o condenado tenha direito à visita ao lar, ele precisa já ter cumprido 60% da pena e estar no regime semiaberto.
O condenado por crimes hediondos pode ter este direito?
Depende de quando ele cometeu o crime. Se foi até o dia 24 de setembro 2019, pode. Essa é a data da alteração da lei de execuções penais, com o chamado pacote anticrime – que incluiu essa proibição no artigo 122.
Segundo o texto, a partir do pacote, “não terá direito à saída temporária a que se refere o caput deste artigo o condenado que cumpre pena por praticar crime hediondo com resultado morte”.
Crimes hediondos com resultado morte são: latrocínio (roubo seguido de morte), sequestro em que a vítima seja morta, estupro e tortura em que as vítimas sejam assassinadas.
Até esta alteração, os condenados por estes crimes podiam gozar deste benefício. Depois da modificação, quem cometeu crimes a partir deste dia, não poderá ser agraciado por este tipo de saída.
“A Lei de crimes hediondos torna mais rígida a execução da pena. Então, ela amplia os requisitos pro preso conseguir benefícios chamados de reinserção social. É bom a gente lembrar que o chamado pacote anticrime de 2019 endureceu bastante a execução penal, principalmente em relação a crimes hediondos seguidos de morte. Mas tb é bom a gente lembrar que só se aplicam a crimes praticados a partir da vigência do pacote anticrime”, diz o professor de direito da PUC Bruno Melaragno.
Outro ponto da lei de execuções penais que provoca discussões é o item 3 do artigo 123. Ele diz que além dos requisitos de tempo de pena, o juiz precisa avaliar a compatibilidade do benefício com os objetivos da pena.
Isso significa, segundo os especialistas, uma avaliação pessoal do magistrado: “Aquele preso que ainda não cumpriu todos esses requisitos, cumprimento de pena, questão de comportamento e diversos outros ou então, de acordo com um dispositivo subjetivo, abstrato, aquele que o judiciário acha que não é compatível com o cumprimento da pena. Ou seja, o judiciário decide que, naquele caso, apesar de todos os requisitos objetivos, matemáticos ali estarem cumpridos, no caso daquele preso, esse instituto de reinserção não vai ser adequado ao cumprimento de pena dele. É nesse item que entra uma análise que a gente chama de subjetiva, abstrata”, acrescenta.
Quem foram os soltos no Rio
Entre os 255 liberados para o Natal no estado do Rio, há dois chefes do tráfico que cometeram os crimes antes da alteração. Saulo Cristiano Oliveira Dias, de 42 anos, conhecido como SL, foi condenado a 18 anos e 9 meses e prisão pela morte de um militar do exército e por associação para o tráfico de drogas.
Ele foi preso em 2012. Segundo as investigações, fazia parte da cúpula da quadrilha que comandava o tráfico no complexo do Chapadão, na Pavuna, na Zona Norte da cidade.
Na mesma situação, foi solto para passar o Natal em casa Paulo Sérgio Gomes da Silva, o Bin Laden. Ele foi preso em 2018 por chefiar o tráfico de drogas no Morro Dona Marta, em Botafogo, Zona Sul.
Sem tornozeleiras
Já são quatro dias do fim do prazo para o retorno dos presos liberados e os 255 fugitivos não se reapresentaram, nem foram presos.
Os presos liberados não saíram dos presídios com tornozeleiras eletrônicas, um instrumento que poderia ajudar a polícia a localizá-los e capturá-los.
O que dizem a Justiça do Rio e a Seap
Segundo o Tribunal de Justiça do Rio, um dos motivos pra não determinar o uso do equipamento foi a falta de estrutura adequada nos presídios
De acordo com a nota da Justiça estadual, “em períodos curtos de sete dias, como o do Natal, e outras datas especiais, como Dia das Mães, o Estado não possui estrutura nos presídios para instalação em tempo hábil dos equipamentos. A instalação das tornozeleiras ocorre fora dos presídios, o que inviabiliza o processo nesses períodos curtos de saída”
O RJ2 perguntou à Seap onde é feita a colocação das tornozeleiras e por que os presos precisam ir a um local fora do presídio para colocá-las e por que a empresa contratada pelo estado não pode ir às unidades para essa instalação.
O órgão respondeu com a seguinte nota:
“A Seap informa que o uso da tornozeleira eletrônica se dá exclusivamente mediante decisão judicial – atualmente a secretaria monitora 8.372 apenados – e que dispõe de um Centro de Monitoração e outras três unidades para realizar a instalação do dispositivo nos casos habitualmente demandados pela Justiça e um contrato que garante o fornecimento de novos equipamentos de acordo com a necessidade. Em relação aos custodiados beneficiados pela Visita Periódica ao Lar (VPL), a secretaria esclarece que não há demanda judicial para a monitoração desses casos que pudesse justificar qualquer medida neste sentido. A secretaria acrescenta que o percentual de beneficiados evadidos vem caindo ano após ano, em virtude, principalmente, de ações de benefícios com remição de pena promovidas pela Seap. De 2021 a 2023, o percentual total anual de evasão dos beneficiários de VPL caiu de 31% para 14%.”