Ao receber alta do hospital em Campinas (SP) na manhã desta quinta-feira (8), um paciente de 53 anos tornou-se mais um vencedor da luta contra a Covid. Sua batalha, entretanto, foi das mais longas. Foram 99 dias internado, 60 deles ligados a um pulmão artificial enquanto seu órgão se recuperava. É o mesmo tratamento utilizado pelo ator Paulo Gustavo, a ECMO.
“No momento que ele tomou consciência de tudo que tinha acontecido nesse período dormindo, ficou assustado. Nunca imaginou que fosse passar por uma coisa dessas”, conta a mulher do paciente, um executivo da área de TI. O casal não quis ser identificado.
Diagnosticado com Covid em março, depois de ter sintomas gripais fortes e dores nas costas, o homem foi internado quando apresentou falta de ar e o quadro piorou rapidamente. Da entrada na unidade à intubação, foram dois dias.
De acordo com o cirurgião cardíaco Gustavo Calado Ribeiro, responsável pelo time de ECMO do Vera Cruz Hospital, o comprometimento do pulmão por conta da Covid-19 chegou a 90%. Sem resposta aos tratamentos convencionais e diante do risco iminente do óbito, ligá-lo ao pulmão artificial mostrou-se a única saída – em toda a pandemia, ele foi o único da unidade hospitalar a usar a terapia.
“Me ligaram pedindo para que fosse ver o meu marido, parecia ser uma despedida, chamei todos da família. O médico me disse que tinham tentado de tudo, mas, que se eu autorizasse, iriam submetê-lo ao ECMO. Com esperanças, e vendo na mídia que o ator Paulo Gustavo fazia o mesmo tratamento, autorizei”, contou a mulher do paciente.
O médico explicou que o uso da ECMO, por sem um tratamento complexo e que envolve uma equipe multidisciplinar grande, precisa atender inúmeros requisitos.
“Nesse período tivemos muitas requisições, por conta da visibilidade do caso do Paulo Gustavo, mas os casos não preenchiam os critérios técnicos. Esse paciente era relativamente jovem, não tinha outros clínicos graves, mas não respondia aos outros tratamentos”, disse.
A terapia de Oxigenação por Membrana Extracorpórea entra justamente para que o pulmão do paciente fique em repouso, enquanto a máquina faz o trabalho. A ECMO já foi utilizada diversas vezes pela equipe em outras situações, como na H1N1 e até com dengue.
“Na época da H1N1, os pacientes ficavam entre 15, 18 dias na máquina. Na Covid, vimos uma distribuição pulmonar maior. O pulmão do paciente precisa ficar mais tempo de repouso, para não estressar e cicatrizar devagar”, explica Ribeiro.
Retirar o paciente da ECMO após tanto tempo, com mobilizações e intercorrências por vários dias, noites, finais de semana, foi uma vitória para a equipe de 20 profissionais, entre médicos, enfermeiros, técnicos de enfermagem, fisioterapeutas, entre outros.
“No nosso grupo da ECMO tivemos perdas pessoais para Covid, até de familiares. Ver a recuperação dele exacerbou o sentimento de realização, de concluir uma maratona. Esse caso de sucesso traz uma sensação de plenitude para toda equipe, de ter podido ajudar alguém. Isso não tem como ser precificado”, completa Ribeiro.
‘Dormindo o tempo todo’
A mulher do paciente relatou que depois de recobrar a consciência, o executivo ficou assustado por descobrir que tinha passado por tantos percalços e por tantos dias. Ele se lembrava de quando foi informado que seria intubado, mas ao acordar já havia passado mais de dois meses.
“Agora ele sabe o que aconteceu. Ele não sentiu nada, não ouviu nada. Para ele foi como tivesse dormido num dia e acordado no outro”, conta a esposa.